Nas assembleias, quando tudo está correndo bem, elas passam despercebidas, mas basta o tema se tornar polêmico, não raro aparecem condôminos “olhando torto” para quem aparece com elas: as procurações.
Primeiramente, cabe esclarecer que a procuração é o instrumento de um contrato que o Código Civil denomina mandato.
Para dar procuração, ou seja, para ser outorgante (mandante) num contrato de mandato, basta ter capacidade civil, o que é definido nos artigos 3° a 5° do Código Civil, como determina o artigo 654, caput, do Código Civil.
Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante.
§ 1° – O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos.
§ 2° – O terceiro com quem o mandatário tratar poderá exigir que a procuração traga a firma reconhecida.
Da mesma forma, para receber procuração, isto é, para ser o outorgado (mandatário), a pessoa deve ter a capacidade civil, com uma exceção, que é a possibilidade do maior de dezesseis e menor de dezoito anos não emancipado ser procurador, como estabelece o artigo 666, também do Código Civil.
Art. 666. O maior de dezesseis e menor de dezoito anos não emancipado pode ser mandatário, mas o mandante não tem ação contra ele senão de conformidade com as regras gerais, aplicáveis às obrigações contraídas por menores.
Para quem imagina que a procuração somente pode ser escrita, lembro que o síndico, ao ser eleito, assume um mandato, ou seja, também nesse caso estamos diante de um contrato de mandato, e isso está caracterizado pelo artigo 653, sempre do Código Civil. Nesse caso, a procuração que o síndico recebe não possui um instrumento, sendo, nesse caso, tácita, pois não se pode dizer que a ata da assembleia que o elegeu pode ser caracterizada como uma procuração, mas o relato dos acontecimentos.
Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato.
O condomínio pode regulamentar a forma de realização de suas assembleias, impondo restrições à utilização de procurações, por exemplo, não permitindo que um procurador tenha mais do que duas ou três procurações, ou ainda impedindo que se vote em assunto em que tenha interesse direto (causa própria) e assim por diante.
Se a convenção do condomínio estabelece tal proibição, isto torna anuláveis todas as decisões baseadas em voto com procuração em causa própria, como, por exemplo, o caso de síndico eleito desta maneira, isto é, que tenha votado em si mesmo através do seu voto e daqueles de quem era procurador. Como a decisão não é nula de pleno direito, mas anulável, é preciso que seja declarada a sua nulidade, por meio de decisão judicial ou, no nosso entender, por intermédio de uma nova assembleia geral extraordinária do condomínio, especialmente convocada, na qual o assunto conste da ordem do dia e seja deliberado e votado pelos condôminos.
Uma questão que pode gerar uma certa polêmica, são os casos em que não haja previsão na convenção da possibilidade de um terceiro ao condomínio, ou seja, que não é inquilino e nem proprietário, participar e votar numa assembleia possuindo procuração.
Via de regra, não há impedimento legal, da mesma forma que não há limite de unidades representadas, desde que o proprietário seja o mesmo, ou seja, qualquer um pode representar e qualquer um pode representar quantas unidades for, salvo em proibição na convenção.
Quanto à procurações genéricas, há que se verificar os limites autorizados. Caso não haja limitações previstas na convenção ou em assembleia anterior, ela é válida.
Outra dúvida muito frequente é se os inquilinos, sem procuração, têm direito de participar e votar. A legislação atual não é clara, e o assunto não encontra consenso entre advogados e outros profissionais do direito. Meu entendimento é que não há na legislação nada que lhes dê esse direito.
Há quem acredite que, com base na Lei 4.591/64, seja permitido a inquilinos participarem de assembleias que tratam de assuntos ordinários, sem procuração, uma vez que são eles os responsáveis por pagar esse custo. Não concordo com essa tese, tendo em vista que a Lei é clara ao dizer que o condôminos são respnsaveis pelas despesas condominiais.
Assim como também há especialistas que entendem que o artigo da Lei 4591/64 foi revogado pelo novo Código Civil e, assim, inquilinos não têm mais o direito de votar sem procuração.
Por isso, para evitar questionamentos jurídicos futuros, o recomendado é que inquilinos que desejem votar em assembleias, requeiram aos proprietários de suas unidades uma procuração para votar em assuntos relativos a despesas ordinárias e extraordinárias.
Vale salientar que toda essa discussão se dá no âmbito de que o inquilino em questão não está munido de uma procuração.
Caso ele esteja portando o documento, pode estar presente em assembleia, sim, podendo representar o condômino votando em assuntos ordinários e extraordinários, se assim o texto da procuração determinar. Importante saber que a procuração pode, inclusive, explicitar a extensão da representação.
O documento pode, por exemplo, dar direito de voto apenas para eleição de síndico, sem poder votar outros assuntos, ou votar apenas assuntos ordinários.
Em alguns casos, o inquilino pode pedir ao seu locador, no contrato de locação, uma procuração para a participação em assembleia.
O entendimento atual é de que são os proprietários quem devem ser convocados a participar das assembleias e não os inquilinos, uma vez que a relação do condomínio é com o proprietário e não com quem está morando no local.
A procuração é o instrumento do contrato de mandato. Somente se a procuração tiver sido conferida com prazo certo é que seu decurso fará cessar o mandato. Neste particular, o Código Civil relaciona, no artigo 682, as várias hipóteses de término do mandato, dentre as quais está a pelo decurso de prazo, no inciso IV.
Art. 682. Cessa o mandato:
I – pela revogação ou pela renúncia;
II – pela morte ou interdição de uma das partes;
III – pela mudança de estado que inabilite o mandante a conferir os poderes, ou o mandatário para os exercer;
IV – pelo término do prazo ou pela conclusão do negócio.
Vivam a vida, e até a próxima.